- Calma que a gente vai dar um jeito.
Pedrinho
tentava tranquilizar Alexandre. Prosseguiram no caminho, passaram pela entrada
do Parque de Exposições, deram a volta no quarteirão. Encontraram oito
estacionamentos, todos cobravam trinta reais. Acabaram sendo parados pela blitz
da lei seca. Depois de cumprirem os
rituais da dura, com o qual há muito estavam acostumados, foram pedir ajuda ao
guarda. Pedrinho foi o interlocutor:
- Com licença
senhor, a gente está procurando estacionamento aqui, mas tá tudo caro. Não tem
um lugar pra gente deixar de graça não?
- Filho, de graça
aqui só aquele. Apontou para o reboque.
– Faz o seguinte, eu fui com a cara de vocês. Desce essa rua, entra no segundo
estacionamento, diga que o cabo Cardozo, mandou cobrar vinte reais.
Entraram no Pássaro
Negro, desceram pela rua. Leandro levantou a questão:
- Será que o
polícia é amigo do cara do estacionamento.
- Você é um
anjinho mesmo Leandro. – Respondeu Pedrinho - Ele é o dono. Ainda bem que eu
desenrolei com ele.
- Grandes merda Pedrinho. Retrucou
Alexandre. - Vai sobrar vinte e cinco reais e dez centavos.
- E daí?
- E daí que
só vai dá pra entrar um seu mongol!
- E como vai
ser? No Palitinho?
- Palitinho
na sua bunda Pedrinho, tá maluco.
- Deixa minha
bunda em paz. Como vamos resolver isso?
- Por mim a
gente deixa esse carro na rua.
- Também
acho.
- É, o carro
não é da mãe de vocês - protestou Leandro.
- Larga de
ser cagão Leandro. Eu deixo o carro lá na entrada de cidade e a gente vem a pé.
A guarda não vai lá rebocar.
- Nem pensar
Pedrinho, se deixarem o carro na rua eu vou ficar com ele.
- Você nem
tem carteira!
- E daí? Eu
fico dentro dele.
- Cagão.
O problema
parecia irremediável, discutiam, levantavam hipóteses, procuravam as ruas mais
afastadas, nada. Pedrinho fez a proposta:
- Xandi, você entra e convence a sua mulé, e as amigas, a irem com a gente
pra outro canto.
- Pedrinho,
essa maconha que você anda fumando está te fazendo mal. Você acha que as
meninas vão largar o show do Juan Santana pra ir com a gente pra outro canto? Deu
ruim meu irmão.
- Pô, entra tu então Xandi, pra não dar bolo
na sua mulé e a gente mete o pé.
- E eu volto
pra casa como? De carona com o pai dela é que não vai ser. Além do mais é o
seguinte, ou é todo mundo no sol, ou é todo mundo na chuva. Tamo junto nessa porra!
- Então
partiu Bar do Bira?
- Partiu, é o
que tem pra hoje.
Fez-se um silêncio, Leandro quebrou o gelo.
- É Xandi, o
Pedrinho estava errado, hoje nem num peitinho você vai pegar...
Tomaram a estrada
de volta para o Rio. Estavam inconformados. Passaram pela porta, viram as
luzes, ouviram o som, viram a galera entrando e deram meia volta. Tentavam
apontar, vejam só vocês, um culpado pelo seu infortúnio. Alexandre dizia que a
culpa era do elevado preço da gasolina, inflacionado. Não pela cotação
internacional do petróleo, mas pelos quase cinquenta por cento de impostos. Pedrinho
se indignava com a privatização das vias públicas e seus pedágios abusivos,
implacáveis tanto na ida quanto na volta. Leandro não entendia como os agentes
públicos, responsáveis pela manutenção da ordem, podiam se associar explicitamente
ao oportunismo do cartel dos estacionamentos. Entraram num consenso de que
seria muito melhor se pudessem contar o transporte público. Sistema que não
funcionava nem para a ida e volta do trabalho, quiçá para o lazer. Neste
momento fez-se um silêncio no carro e os pensamentos de Alexandre puderam
alcançar Rafaela.
Rafaela com
seu sorriso largo e suas ancas proeminentes, toda faceira na vaquejada.
Alexandre havia enviado uma mensagem dizendo que tinham ficado presos na Lei
seca. Rezava para ela acreditar e se compadecer deles. Cogitava que, caso ela
ficasse com raiva, ia se vingar ficando com outro cara. Ou pior, ficasse com outro cara só por falta
de companhia, para preencher uma lacuna deveria ser dele. Aquela ideia consumia
suas entranhas, será que ela seria capaz? Ele estava tão perto... Ah Rafaela...
será que ela ia acreditar? Nesse momento de desespero e melancolia somente a
palavra de um amigo poderia resgatá-lo. Foi o que fez Leandro, ao perceber o companheiro
olhando inconsolado para o teto do automóvel:
- Xandi, você
sabe que a essa altura do campeonato você já deve ser corno?
- Que mané corno? Eu não tenho mulé não! Tamo só ficando.
- Tenho que
concordar com ele Xandi, depois de um bolo desses, ela já deve ter ficado com a
metade daqueles cowboys...
- Problema é
dela Pedrinho. Como é que posso ser corno se nem mulé eu tenho. Já disse que sou muleque
piranha.
- Corno!
Daí seguiu
uma discussão sobre os pré-requisitos para um sujeito ser considerado
oficialmente corno. Pedrinho e Leandro concordavam que ao menos corno em
potencial Alexandre já era. Chegaram de volta ao bairro. Estacionaram em frente ao bar do Bira, que ficava
a quatro quadras da casa de Leandro. Haviam feito um percurso de cento e nove
quilômetros e dois pedágios para chegar. Decidiram beber a grana que sobrara,
cada centavo, o que não seria muito, mas o bar sempre acolhe os desafortunados.
Encontraram a turma de sempre. Amigos e amigas da escola, da vizinhança, da
noite. Dentre eles estava Michele, que
tinha sido arrastada para o Bar do Bira pelas amigas. Elas tentavam tira-la de
uma depressão que perdurava semanas. A coitada teve seu coração partido por um
canalhão profissional. Vivia o ápice do drama adolescente, onde tudo é
superlativo e cada amor perdido é o último da humanidade.
Não demorou muito para que as melancolias de
Alexandre e Michele começassem a vibrar na mesma frequência. Foram atraídos pelo
olhar apagado de um, o sorriso amarelo de outro. Encontraram-se na tristeza, na
frustação, no embargo, no vazio do peito. Conversaram como se estivessem
sozinhos na mesa. Compartilharam amarguras. Brindaram à derrota. Esqueceram-se
do tempo, da ocasião, dos outros ao redor. Quando ela se afastou da mesa para
ir ao banheiro com umas amigas os meninos se aproximaram:
- E aí Xandi.
Já se apaixonou de novo?
- É, eu tenho
essa mania – abriu um sorriso insosso - ela está numa pior Leandro, isso não
tem nada a ver.
- Tô vendo. Ou
será você quem está numa pior? Sacode essa poeira cara, você é brasileiro! Dá um
lance.
- Será?
- Chifre
trocado não dói - provocou Pedrinho.
- Lá vem vocês
com esse papo de novo...
- Se você não
der um lance eu vou dar, ela tá gostosinha cara...
- Porra
Pedrinho, você quer comer todo mundo?
- Olha lá -
apontou Leandro - elas estão voltando, vai dar um lance ou não vai?
Alexandre olhou
dentro dos olhos melancólicos de Michele. Ela, embora estivesse no outro
extremo do bar, sentiu a conexão, acusou o golpe. Ele deu um gole na cerveja,
respirou fundo, levantou da cadeira, estufou o peito:
- Diz aí
Pedrinho, será que ela deixa pegar no peitinho?
Muito bom! Nada previsível... Pensa sério em escrever um livro...
ResponderExcluirMuito bom! Nada previsível... Pensa sério em escrever um livro...
ResponderExcluirArrasou meu amor! Como bem disse a Andressa pensa no livro e já sou sua revisora oficial.
ResponderExcluirEstória envolvente, trivial e ao mesmo tempo de uma discussão complexa. Muito bom!
ResponderExcluirValeu galera!
ResponderExcluirValeu galera!
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