segunda-feira, 3 de junho de 2019

Zen

Há, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, um magnífico bambuzal. A touceira cresceu de forma circular deixando ao meio uma clareira, cujo chão forrado de folhas, é um convite a mais leniente das sonecas. Quando os bambus se tocam, sob ação da brisa, ouve-se uma gostosa cantiga de ninar.

Tal soneca, porém é impossível. Não se pode sentar ao chão sob as árvores do jardim botânico. Deitar então, imagina. Assim como não se pode correr pelas alamedas (exceto se você for sócio e vir fora do horário aberto ao público geral), entrar com pets, fazer piquenique, etc. São tantas medidas civilizatórias que qualquer dia desses hão de proibir a entrada de seres humanos.

Uma vez encontrei lá no bambuzal uma turma fazendo aula de meditação. Meditação de pé pois, lembre-se, não se senta no chão do jardim botânico. 

A turma era composta por duas professoras da rede municipal aposentadas. Um jovem casal de Botafogo que achou legal vir de pijama. Três alunas da PUC - todas elas se parecem com a Malu Magalhães. Um cara barbudo, despenteado de bermuda e camisa social – dizem que isso se chama hipster. Um militar reformado cuja barriga começou a ser cultivada nos tempos da ativa e sua esposa toda trabalhada na plástica – sabe quando o rosto não combina com o corpo? Duas suburbanas risonhas, meio deslocadas, uma delas grávida. E um cara com pinta de triatleta.

A professora de meditação, uma senhora de meia idade magrinha e bem branca,  orienta a turma dizendo que a cada intervenção deve-se entoar o mantra Om. Sabe qual é? Aquele que faz – Oooooooom... Tipo o Malabi da TV Colosso. Pois bem, a professora dizia:

- Ouçam a sua respiração.

E a turma:

- Oooooooom...

- Ouçam o som de seu coração.

- Oooooooom...

- Sintam a brisa e o som das Árvores

-  Oooooooom...

Um bem-te-vi canta ao longe e a professora pega a deixa:

- Fiquem atentos ao som da natureza.

- Oooooooom...

Toca-se uma buzina na Pacheco Leão.

- Desliguem-se do mundo material e das preocupações cotidianas.

- Oooooooom...

Ouve-se outro bem-te-vi, agora em dueto com uma cambaxirra.

- Atentem-se a beleza do tempo presente.

- Oooooooom...

- O passado e o futuro são ilusões de nossa mente.

- Oooooooom...

- Para o módulo avançado do curso de meditação acesse nossas redes sociais com a hashteg "esse cronista não faz merchandising".

- Oooooooom...

- Respirem fundo.

- Oooooooom...

- Alinhe os ombros.

- Oooooooom...

A brisa sopra, o bambuzal canta, suave melodia.

- Aos poucos sua freqüência cardíaca vai baixar.

- Oooooooom...

- Relaxe os músculos da face.

- Oooooooom...

- Sua respiração vai ficar mais fluida.

- Oooooooom...

- Sintam a toxicidade deixar seu corpo

- Oooooooom...

Então, furtivamente, o que se houve da professora é uma estrepitante flatulência.  Em termos menos eruditos: Mano do céu! A professora mandou um peido sinistro! E então, sem ruborizar:

- As vezes a toxicidade se materializa e sai do corpo em forma de gases.

- Oooooooom...


 Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição 4.0 Internacional


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