domingo, 4 de fevereiro de 2024

Montanha russa




As amizades me levam por caminhos definitivamente inglórios. Outro dia desses eu fui parar num parque de diversões junto com o Celsinho, o Alemão e o Encantado. A gente chama o Encantado de Encantado porque ele se parece com o Príncipe Encantado daquele filme do Shireck. Figuraça. 

Agora vejam vocês,  eu e três outros marmanjos de meia idade concordamos que seria uma ótima ideia andar de montanha russa num calor de quarenta graus. Sabe aquele dia em que até o vento é quente? Aquele vento escaldante que perde a sua função apaziguadora e passa a atuar como aliado da quentura a nos cozinhar lentamente. Pois então estava assim o clima.

A primeira volta de montanha russa foi divertidíssima, tão divertida quanto a sensação de tontura ao término da brincadeira. Se o amigo leitor é da minha estirpe sabe bem como é legal essa sensação de tontura. Eu mesmo quando era menino brincava de rodar até cair no chão. Dizem que isso é porta de entrada para outras drogas no futuro. Deve ser. Cá estou eu a andar de montanha russa no verão.

O problema é que a tontura não passou dentro do tempo regulamentar de uma pessoa normal que anda numa montanha russa normal. O amigo Celsinho foi o primeiro a notar.

- Tá tudo bem aí Lapa?

- Rapaz... Bateu aqui uma onda... O mundo meio que tá girando mais rápido que o de costume.

Celsinho deu uma gargalhada. Acontece que o Alemão estava empenhado em ir na montanha russa o máximo de vezes possível e, pouco tempo depois, arrastou a gente para a segunda andada de montanha russa. Eu deveria ter negado. Mas sabe como é. Preciso manter minha fama de mau. Lá fui novamente, claramente sem ter condições para tal.

Aí bateu uma bad trip sinistra. Perdi totalmente o sinal do GPS. Parecia que o mundo estava descendo uma corredeira de rafting. E se passou dez minutos, quinze, meia hora, metade da tarde. Nada da tontura passar. Os amigos andaram de montanha russa o restante do passeio e eu fiquei bebendo água gelada sentadinho na sarjeta. Foi humilhante? Nem tanto, eu já cometi vexames muito menos publicáveis que este. Muitíssimo.

Justiça seja feita o único amigo que se se solidarizou comigo foi o Encantado. Mesmo porque, em se tratando de experiência em cometer vexame, ele está na mesma categoria que eu. Nesse mesmo dia ele aprontou uma. O nome disso é empatia:

- Lapinha será que você não tem labirintite?

Pois bem senhores, lá fui eu na semana seguinte faze exame de labirintite. Vocês já fizeram exame de labirintite? É o único da medicina com cem por cento de eficácia. Porque se você não tem labirintite acaba contraindo no momento do exame. Uma maravilha.  O procedimento consiste em enfiar uma mangueira no seu ouvido e soprar um ar quente até te provocar uma labirintite. Daí eles te perguntam: – É isso que o senhor sente quando fica tonto? –  Você responde que sim e ganha um certificado de labirintite. Sucesso total.

O inferno é que, terminado o exame, o mundo não para de rodar por um longo tempo. Olha que eu tenho experiência nisso de mundo girando. Mas é num rpm que não tem porre que alcance. Vai por mim.

No dia seguinte levei o exame para a doutora que o havia me prescrito. Ela receitou um remedinho, limitou meu café a três míseras doses diárias – não antes de me ensinar que uma dose de café são, pasmem, 60 ml – pediu para cortar tudo que tem açúcar em excesso e toda sorte de coisa que pode acelerar o sujeito. Tá ficando difícil ser eu. 

- Doutora e o álcool.

- Como assim?

Me arrepiei de medo

- A cervejinha doutora?

- Ah... Sem restrições adicionais por conta disto. Bebida alcoólica você pode continuar tomando, mas com a moderação de sempre.

Ainda bem que ela não me conhece.


 Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição 4.0 Internacional.

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