quinta-feira, 7 de setembro de 2017

O primeiro sabiá do ano

Os sabiás têm por hábito cantar ao fim do inverno, inaugurando a luz e os ventos da primavera. Ventos que alcançaram-me numa viagem pelas montanhas de Minas Gerais, num trecho de estrada às margens do Parque Estadual do Itacolomi.

Há no topo desta rodovia uma ponte seca e uma curva acentuada à esquerda donde se descortina uma imensidão de serra. A sensação é de que uma infinitude de colinas caminha ao vento numa marcha serena. A luz que neste trecho é prata e vibrante vai tomando um tom de sépia na medida em que nos aproximamos de Ouro Preto, onde uma linha assimétrica de casarões ergue uma montanha do fundo de um vale.

Uma fila de janelas coloridas serpenteia pelas encostas num traçado de córrego, teimoso e cambaleante. Diante desta visão fui tomado por uma sensação de pertencimento ímpar. De alguma maneira que não posso explicar eu era parte daquele acontecimento: ouropretano. Andei ladeira por ladeira com paradas estratégicas para broas de milho e cafés passados no coador de pano. Outras ladeiras mais e encontrei velhos amigos. Tomamos pinga, um jiló para tirar o gosto da pinga, um torresmo para tirar o gosto do jiló...

Segui minha caminhada e me deparei com um largo onde havia uma igreja que parecia concebida por um sonho. Perdi a conta de quanto tempo me custou observar todos os contornos da faixada barroca.  Nos fundos havia um cemitério pequenino e mais adiante um jardim donde se avista todo o casario colonial. Pude ver a brisa acariciando os telhados e senti a luz parar como numa fotografia antiga. Foi então que aconteceu, assim mesmo de repente, mágico. Ouvi o primeiro sabiá do ano, saudando a vida com sua canção de flautista apaixonado.


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E tem esse meu primo Célio, que na intimidade a gente chama de Celinho, de alguma forma ele sempre foi vanguarda. No início da d...