domingo, 18 de julho de 2021

Celulares


Outro dia o meu amigo Juliano me enviou um áudio puto da vida. Os áudios de zapzap que o Juliano passa quando está com raiva são o que há de mais hilário  desde a primeira edição da Escolinha do Professor Raimundo em 1957. Ele estava enfurecido com sua filha caçula que havia perdido o iphone no Pão de Açúcar. Pão de Açúcar o supermercado, não o Pão de Açúcar pão de açúcar.

 Ao que eu respondi:

- Corolho Juba! Foi fazer o quê nesse mercado de playboy?

- Promoção de cerveja Lapa.

- Atá.

Daí ele mandou outros nove minutos de áudio dizendo que a pequena era irresponsável, desatenta, que não dava valor pra nada, bla-bla-blá. Eu falei pra ele pegar leve com a menina que é só uma adolescente. 

Eu que sou quarentão vivo perdendo celular. Enquanto existiu o hábito de sacar dinheiro eu perdia ao menos um aparelho por ano deixando  em cima do caixa eletrônico. Só nessa modalidade de esquecimento foram incontáveis desde a época do Nokia tijolão.

Já na era do smartphone o primeiro que perdi foi na praia. Saí com ele na mão, quando alcancei a calçada o deixei sobre um banco pra poder limpar o pé sujo de areia e lá no banco ele ficou. Outro caiu do bolso da camisa social direto no vaso sanitário do consultório da pediatra do meu filho. Eu até superei o nojinho e resgatei o aparelho, mas ele não voltou a funcionar. Teve um que perdi para um assaltante na linha 247 altura da rua 24 de maio.

Teve também o que eu perdi no meio da pancadaria que foi a final da escolha do samba do Império pro carnaval de 2019, esse é o único que assumo a culpa, pela perda, não pela confusão. O último perdi quando fui tomar vacina da gripe, na verdade não perdi, eu deixei cair. O coitado quicou 3 vezes na calçada do posto de saúde de Vista Alegre e ficou com a tela parecendo um mosaico árabe. Como obra de arte ficou até bonito, só não tem mais utilidade.

Depois desse longo relato o Juliano me perguntou:

– Quantos desses era iphone Lapa?

 – Nenhum né parceiro, você também nem parece suburbano. É supermercado Pão de Açúcar, iphone pra filha, os caraio a quatro... Deve tá comendo nutella com pão francês da Padaria Majestosa.

Depois dessa enquadrada ele decidiu voltar no supermercado. Ao que parece, esses aparelhos tem um localizador superpotente. Lá ele achou o celular todo espatifado no estacionamento:

 – Lapa, aquela marmota deixou o celular cair na hora que entrou no carro, daí eu passei com a roda por cima dele, inacreditável... - Mais 8 minutos hilários de áudio que eu não posso reproduzir aqui por se tratar de um blog de família. Ou quase.

Uma semana depois o Juliano me manda uma foto de um iphone e um áudio todo contente:

- Lapa, não dá pra acreditar. O Amigo lá de Lucas trocou a tela do iphone que eu passei com o carro por cima. Zero bala. PQP! Esse senhor Stivie era foda mesmo.

Ok Juba, só não me chega na pelada de quinta-feira lá do Engenho de Dentro dizendo que acha o Stivie Jobs foda. É pro seu bem. Por favor.



 Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição 4.0 Internacional



 

 


domingo, 4 de julho de 2021

Ressaca - Uma crônica pra você que escolhe vacina.

No Réveillon de 96 para 97 eu tive a maior ressaca de minha nada mole vida. 

Na década de noventa era costume no subúrbio carioca a gente remover a coroa do abacaxi, sacar o miolo, amassar a popa até a fruta ficar meio que oca. Tá ligado? Daí a gente preenchia o buraco formado com vinho de garrafão, uns cubos de gelo e vráuuuu mandava pra dentro.

Pense num trem doce! Abacaxi de verão, comprado naqueles caminhões com placa de Marataízes – ES. O sabor vem apurando por 408 km na BR 101 até chegar na feira de domingo na Praça Seca. Você mistura com aquele vinho tinto suave comprado a granel no Castelo do Pechincha, gelo pra kct, duas folhinhas de hortelã. Eu, mlk piranha do subúrbio, mal saído das fraldas... Caí matando. Antes do dia raiar eu achava que quem ia morrer era eu.

Cara, eu vomitei muito. Muito. A expressão “botar os bofes pra fora” foi inventada em minha homenagem. Me lembro até hoje de vomitar uns grãos de  arroz pintados de roxo, roxo do vinho tá ligado? Olha. Me veio a memória... deu... deu até uma ânsia aqui...
....

Eita!
...

Espera.
...

Gente do céu, vocês não sabem como eu passei mal. Em 1997 eu não comi arroz, não aguentava olhar. Vinho idem. Não que eu tenha virado abstêmio. Até jurei que não voltaria a beber, mas fiquei sem álcool só até o São Sebastião, afinal há de se manter a tradição de embriaguez em feriados católicos. Bebi cerveja e tal, pois vinho não descia. Fiquei sem beber vinho até a vinda do outro século. E só voltei a beber por conta de um rolo com uma mina de Mauá, mas isso é tema de outra crônica.

Voltando ao Réveillon de 96 para 97. Olha... Eu fiquei mal. E o pior não foi nem a araponga na minha cabeça ou a sensação de estar dentro de uma máquina de lavar. O pior foi que eu não parava de vomitar. Eu vomitei tudo que havia comido desde o desmame. Vomitei as vísceras, a vida, a dignidade, por fim eu estava vomitando vácuo. Tá ligado vomitar vácuo? Seu corpo dói, você se contrai todo, abre a boca não sai nada. Nada. Nem arroto... Nem o ar dos pulmões. Nada.

E eu fazia um som esquisito, fazia um - RôôôôôôÔÔÔÔÔÔÔÔôoooo..... – Bem grave.

Na época aquele filme do exorcista estava na moda nas locadoras. Começaram a olhar esquisito pra mim.

Minha tia convenceu minha mãe a chamar o pastor. Foram bater na casa dele, mas o sujeito estava curtindo o fim de ano em Garatucaia. Procuraram o padre, mas ele estava muito ocupado para atender gente de minha laia. Sobrou para Dona Lucinha, rezadeira e mãe de santo de um terreiro lá perto de casa.

Estava eu a questionar o sentido de morrer em plena juventude quando Dona Lucinha adentra ao quarto. Ela vestia uma camiseta branca com uma imagem da sagrada família:  Jesus, Maria e José. Calças pantalonas igualmente brancas e bem vincadas. A cabeça adornada com um turbante, nas orelhas um par de argolas douradas.

Se aproximou de mim. Como era bonita a Dona Lucinda! As sobrancelhas erguidas, os olhos levemente puxados, o nariz arrebitado. Me olhou com ternura e sorriu com sua boca grande e dentes muito alvos. Sentou ao meu lado na cama. Foi no pé da minha orelha esquerda e sussurrou com uma voz que parecia a da Íris Lettieri:

- Você bebeu né meu filho?

Ao que eu tentei responder, mas a voz não quis sair. Meio que por fraqueza.  Meio que por receio dela ser o anjo enviado para me levar dessa pra melhor.

Dona Lucinha me fitou nos olhos novamente. Se aproximou da minha orelha direita dobrando-se sobre meu corpo. Senti um geladinho dos seus colares a roçar meu pescoço.

- Tá tudo bem, vai passar, quem tá contigo é mais forte.

Levantou-se e foi embora. Ainda pude ouvir sua voz dizendo a minha mãe:

- De espiritual não tem nada. As tripas e o baço é que já não servem mais pra muita coisa. Dê chá de carqueja ao menino.

Foi o que me valeu.

Aquilo sim foi uma ressaca.

Agora vocês aí com medinho de ressaca de vacina. Tome tento minha gente! Como faz falta uma havaiana cantando no lombo de vocês viu?

Tomei a minha primeira dose de vacina essa semana. Tive ressaca? Sim claro. Delícia.

Uma moleza... Febrezinha de trinta e sete e meio (convenhamos que nem é febre)... Tomei uma dipirona e fui dormir feliz da vida por ter sido dispensado da lavagem da louça.

Não tá bom?

E ainda fiquei repetindo para meus anticorpos enquanto o sono não vinha:

- Marquem a cara desses filhos da puta! Marquem a cara deles...


 Este trabalho está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição 4.0 Internacional


 

 


Meu primo Célio

E tem esse meu primo Célio, que na intimidade a gente chama de Celinho, de alguma forma ele sempre foi vanguarda. No início da d...