sábado, 20 de junho de 2015

O ermitão



Sentiu nojo de leite
asco da terra
ojeriza à sujeira.
Tinha repugnância à dor
pânico de cair
temor ao escárnio
Tinha aversão a compartilhar
medo do aprendizado
horror a brincadeiras
receio de fazer amigos
Escolheu não ser criança

Sentiu nojo do sexo
asco do suor
ojeriza ao desejo
Tinha repugnância aos relacionamentos
pânico de se decepcionar
temor às doenças venéreas
Tinha aversão à entrega
medo de confiar
horror à dependência
receio de ser traído
Escolheu não amar

Sentiu nojo da poeira
asco do desconhecido
ojeriza à estrada
Tinha repugnância ao exótico
pânico de ser surpreendido
temor de não ser aprovado
Tinha aversão à novidades
medo de viajar
horror à estrangeiros
receio de provar
Escolheu não conhecer

Sentiu nojo da comunidade
asco do fracasso
ojeriza a compartilhar
Tinha repugnância aos olhares
pânico de desconhecidos
temor da falência
Tinha aversão ao risco
medo de gente
horror à aglomerações
receio de ser assaltado
Escolheu não conviver

E eis que ao chegar da hora
a morte odiou a sua vida de tal forma
que decidiu jamais ceifa-la
E ele jaz, imaculado,
em sua concha original

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