Amigos, uma contusão infame nos
tendões afastou-me temporariamente do mundo das letras. Mas não falemos de
nossas auguras, não percamos esse tempo. Eis-me aqui de volta a brincar com as
palavras. Numa semana repleta de alegria. Pois retomo o ofício e vivo a
ansiedade de partir para a região onde o Brasil nasceu e se criou. Em breve
estarei na contramão dos retirantes. Sinto-me como a raposa do príncipe.
Vou para a terra cujo coração é
agudo, metafônico. Donde o vento é insistente, a nuvem passa ligeira e a água é
sempre morna. Serei recebido por aromas, sons, sotaques e abraços. Amizade por
lá é feito a jurema, que quando a água vai-se embora seca, mas não perece.
Permanece, resiste, adormece e espera. E eis que ao cair da primeira gota, do
primeiro sorriso, ainda tímido, escondido por de trás da porta do saguão, ela renasce. Verde, vibrante, luminosa, apaixonada. Que saudades da jurema!
Em breve sentirei o frescor do
coentro, o pulso da zabumba e o ardor do sol, pimenta implacável. Vou saborear
o caju, a mangaba e o cajá. Secarei a língua na aguardente para tornar a
salivar no sal da carne, do camarão e da castanha. As manhãs serão feitas de
queijo de coalho para que as tardes se derretam como manteiga, esparramada numa
rede preguiçosa.
Lá os timbres são sempre graves,
como o de Januário, pai de Luiz, o rei. Mas também sabem ser manhosos como o de
Dorival. Terra de bravos varões, leões do norte, graciosas caboclas, mamelucos
audazes e galegas determinadas. Olhos de Holanda, retos, sinceros. Gente
austera, cuja dureza persiste até o segundo acorde do acordeom, às vezes até o
primeiro.
Vou para a terra da luz – tudo
aqui gosta de luz Lapinha, se não, não se cria– já diria o um sujeito sabido lá
de João Pessoa. Conhecer o brilho intenso dos dias desta terra não exige muita
sapiência, porém só os viajantes mais atentos percebem que a melhor luz se dá
na madrugada. Seu Catulo era um gênio, não há sob o firmamento luar como esse.
Há uma quantidade colossal de luz na noite do sertão. É o melhor lugar do mundo
para ter insônia. O mar é sempre vasto, ora é feito dum azul ímpar, ora é verde
cor de cana, ora é cinza como a tabatinga seca.
Meu coração não se aquieta dentro
do peito, se aproxima a hora de eu rumar para lá. Chegarei junto com os festejos de São João. E
Antes que a meninada lá da Lapa venha me cobrar às dívidas de jogo, e os
amigos de Del Castilho organizem o bota-fora, vou avisando que tudo isso é
temporário. Por enquanto.
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